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Caieiras,09/03/2025

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Comércio especializado vende de lingerie à prova de revista a 'kit visita' para mulheres em porta de presídio masculino

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Na unidade prisional em Hortolândia, mulheres são maioria para ver detentos. Série do g1 aborda desigualdade de gênero no contexto carcerário. Comércio no entorno de presídio masculino se 'especializa' em visitantes mulheres
Kit de comida, itens de higiene, lingeries para visitas íntimas... Esses são alguns dos itens encontrados à venda no entorno do Complexo Penitenciário de Hortolândia, no interior de São Paulo – estado com maior população carcerária do país.
Ali, ambulantes criaram uma rede de comércio especializada em produtos autorizados na prisão e focada no público feminino que, embora dentro dos presídios receba menos visitas do que os homens, do lado de fora é maioria na fila para visitá-los.
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O g1 passou a manhã de um sábado na fila de entrada do presídio e mostra um pouco do chamado "comércio padrão SAP" (em referência à Secretaria de Administração Penitenciária).
Para quem visita são oferecidos produtos que ajudam a passar pela revista sem transtornos:
Roupas íntimas sem detalhes metálicos, que não 'apitam' no escâner corporal;
Lingeries de renda, que as visitantes usam na visita íntima a seus companheiros;
Bolsas de plástico transparente, que facilitam a revista dos produtos levados aos presos;
Potes de plástico transparente para guardar alimentos;
Calças legging, camisetas e blusões sem detalhes metálicos e nas cores autorizadas.
E há, também, itens destinados a quem está preso:
Muitas guloseimas, incluindo doces, salgadinhos, refrigerantes e balas;
Itens de papelaria, como canetas e cadernos, além de cigarros;
Aparelhos de barbear, sabonetes e desodorantes;
Uniformes novos.
Na unidade em Hortolândia são 14 mil visitantes cadastrados, dos quais 75% são mulheres, que, todos os finais de semana, se mobilizam para reencontrar os presos (assista ao vídeo acima).
Esta reportagem é parte da série “Dia de visita: a solidão da mulher no cárcere”, publicada pelo g1 na semana em que se celebra o Dia da Mulher.
De mulher para mulher
Sara Diene vende lingeries, roupas e outros acessórios para visitantes de presos
Estevão Mamédio/g1
Quem não teve tempo de fazer mercado na véspera pode ir às compras em um dos pequenos comércios que ficam na calçada oposta aos portões de entrada do complexo. Lojas e barraquinhas improvisadas, comandadas por mulheres, oferecem de tudo um pouco para que as visitantes façam bom proveito do grande dia (assista ao vídeo acima).
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"Vendo de tudo que entra [na prisão], pra atender tanto a família do reeducando, quanto o reeducando", comentou Sara Diene. O tudo, aliás, não é exagero da comerciante. Por lá é possível encontrar guloseimas, potes, uniformes novos para os detentos e até lingeries à prova de revista – para encontros íntimos na cadeia.
O dia de visita
Comércio no Complexo Penitenciário de Hortolândia, no interior de São Paulo
Yasmin Castro/g1
O Complexo Penitenciário de Hortolândia é formado pelos centro de Detenção e de Progressão provisórios, CDP e CPP, e pelas Penitenciárias II e III – os três últimos chamados de P1, P2 e P3. Até o começo do ano passado a população chegava a 4.810 e estavam cadastrados 14.095 visitantes, conforme o Sisdepen e a SAP.
A visitação é sempre aos sábados e domingos, das 8h às 16h. Para quem tem um comércio nas redondezas, o expediente começa bem antes, ainda na madrugada. As vendas ocorrem em barraquinhas com cobertura de lona, carrinhos de lanche e pequenas mercearias, das quais algumas oferecem banheiros pago.
E o que mais vende? Sara responde. "Refrigerante, né? Dois litros, bolsa, né... Os tupperware [vasilhas de plástico], que é uma coisa que padronizou e aí, tipo, tem que ser desse jeito".
Silvana é dona de uma barraquinha de lanches na frente do Complexo Penitenciário de Hortolândia
Estevão Mamédio/g1
Silvana Alencar, que ficou conhecida como 'tia', também oferece conveniência. "Todo sábado e domingo nós estamos aqui pra ajudar, guardar bolsa, guardar celular. Tudo aquilo que ela precisa que seja guardado aqui, porque não entra dentro do presídio, a gente guarda até ela sair".
Já Tábata Francis se destaca pelos pastéis, que são o café da manhã de muitas visitantes. "As meninas comem pastel, antes de subir. Até mesmo porque elas não gostam de comer a comida que elas levam para os familiares, né? E aí elas acabam tomando café aqui".
O acolhimento vai de brinde
É de se esperar que, em meio a tanta dedicação, também haja espaço para um produto que não se paga em PIX ou cartão de crédito. Além das mercadorias, as comerciantes também oferecem acolhimento aos clientes que, muitas vezes, só precisam de atenção.
“O pessoal chega, nossa, muito difícil… Não sabe nada, não sabe nem onde tá o preso. E a gente tenta ajudar da melhor forma possível. Às vezes com conhecimento que a gente tem e com experiência, a gente acaba orientando o pessoal”, explica Sara.
Na oportunidade de vender, elas também acabam ensinando, como destaca a tia Silvana. “Algumas meninas que estão chegando de presídio novo, vem pra cá. Chegando aqui elas chegam toda perdida, sem saber a roupa que entra”.
“Aí a gente vai e aconselha, porque tem roupas que não entram, como preta, azul royal… Roupa branca, porque são as roupas dos meninos [presos] lá dentro, e a cinza e preta, porque é do agente penitenciário”.
“É onde a gente vai, faz um precinho camarada, porque o gasto delas é muito grande, muito grande mesmo. Não é fácil você manter um preso na cadeia. E tem gente que vem de longe, paga transporte. Então, é muito difícil você manter um familiar seu preso dentro de uma cadeia”.
Pastéis vendidos por Tábata Francis são café da manhã de visitantes
Estevão Mamédio/g1
Suporte emocional
Ajuda prática e emocional também. Tábata, por exemplo, se sensibiliza com as histórias e tenta oferecer conforto. “A gente vê bastante situações, sofrimentos que elas passam. É, mas faz parte, assim, né? Mas é bem triste”.
“Porque aqui as pessoas desabafam muitas situações, né? Então a gente consegue falar um texto da Bíblia, consegue poder confortar de alguma forma. Não é só trabalhar com vendas, né? A gente consegue ajudar ele de alguma forma”.
No fim das contas, as mulheres do comércio penitenciário se sentem recompensadas. “É meu ganha pão. Mas, tipo, poder ajudar.... E a gratidão. Essa semana mesmo, teve uma que o filho saiu. E ela me ligou, assim, chorando, agradecendo”.
“O filho, né, manda uma mensagem pra mim e é muito bonito isso. Ela agradecendo, mandou lembranças pro meu filho. Poxa, o que vocês fizeram por mim? Então, assim, isso é muito gratificante. E eu amo o que eu faço”.
'Os arredores da prisão são femininos'
O que para alguns pode ser visto como uma mera oportunidade de negócio, para a pesquisadora e antropóloga Natália Corazza Padovani, do Núcleo de Estudos de Gênero Pagu-Unicamp é mais um exemplo do papel importante das mulheres no sistema carcerário. Nas palavras dela, os arredores da prisão são femininos.
"É interessante pensar que o que suporta uma instituição como a penal, são essas redes de cuidado que estão sempre nos entornos das prisões. Dessas mulheres que guardam as bolsas, que ensinam as roupas com as quais você pode entrar dentro de uma prisão ou com as quais você não pode entrar dentro de uma prisão, que tem ali uma mudinha de roupa ou para emprestar ou para alugar".
"Que são mulheres que têm o aprendizado [...] o que a gente vê é que quem suporta com cuidado e quem mantém a instituição prisional ainda são essas redes de aprendizado, de afeto, que vão sendo criadas nos entornos das prisões, através delas, e que são femininas.".
Complexo Penitenciário de Hortolândia, no interior de São Paulo, em dia de visita
Estevão Mamédio/g1
'Dia de visita: a solidão da mulher no cárcere'
Na semana do Dia das Mulheres, o g1 publica a série especial “Dia de visita: a solidão da mulher no cárcere”, que aborda as diferentes relações e desafios que elas enfrentam diante o sistema prisional. A série vai mostrar:
Relatos de mulheres que criaram uma rede de apoio e movimentam a economia local no entorno dos presídio
O que está por trás do abandono da mulher encarcerada segundo especialistas
Histórias na fila de mulheres que visitam homens em um complexo penitenciário de SP
Dados de visitação para mulheres e homens no sistema penitenciário
O encontro da reportagem, dentro do presídio, com mulheres sem visita há quase 3 anos
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